Púrpura Trombocitopênica Imune - tratamento
Considerações iniciais
A Púrpura Trombocitopênica Imune (PTI) é uma doença autoimune caracterizada pela destruição de plaquetas pelo próprio sistema imunológico, resultando em baixas contagens de plaquetas no sangue (trombocitopenia) e, consequentemente, em maior risco de sangramentos.
O tratamento da PTI é individualizado e depende de vários fatores, como a gravidade da trombocitopenia, a presença e intensidade dos sangramentos, a idade do paciente e a duração da doença (recém-diagnosticada, persistente ou crônica).
Objetivos do Tratamento
O objetivo inicial do tratamento da PTI não é normalizar a contagem de plaquetas, mas sim elevar a contagem a um nível seguro (geralmente acima de 20.000-30.000/mm³) para prevenir sangramentos clinicamente significativos, especialmente sangramentos graves.
Muitas diretrizes indicam que, se o paciente estiver assintomático ou com sangramentos leves (petéquias, equimoses), e a contagem de plaquetas estiver acima de 20.000-30.000/mm³, pode-se optar pela observação cuidadosa em vez de tratamento imediato. No entanto, se houver sangramento clinicamente significativo, risco de sangramento grave (por exemplo, idosos ou com comorbidades), ou necessidade de procedimentos invasivos, a intervenção é geralmente indicada.
Transfusão de Plaquetas:
Geralmente reservada para emergências com sangramento grave ou com risco de vida, pois as plaquetas transfundidas tendem a ser rapidamente destruídas pelo sistema imune do paciente com PTI. Costuma ser combinada com IgIV e/ou corticosteroides.
Opções de Tratamento
As opções de tratamento para PTI são divididas em primeira linha, segunda linha e outras terapias para casos refratários.
1. Tratamento de Primeira Linha
Indicado para pacientes com sangramento ativo ou com contagem de plaquetas muito baixas (geralmente abaixo de 20.000-30.000/mm³).
1.1. Corticosteroides (Prednisona, Dexametasona, Metilprednisolona):
São a base do tratamento inicial. Eles suprimem o sistema imunológico, diminuindo a destruição de plaquetas.
Prednisona oral: Geralmente 1 mg/kg/dia por algumas semanas, com desmame gradual.
Dexametasona oral ou intravenosa: Pode ser utilizada em pulsos (ex: 40 mg/dia por 4 dias, repetido a cada 14 ou 28 dias por alguns ciclos) para uma resposta mais rápida e potencialmente menor exposição a longo prazo.
Metilprednisolona intravenosa: Usada em pulsos intravenosos (ex: 1 g/dia por 3 dias) em casos de sangramento mais grave ou quando se busca uma elevação plaquetária rápida. Os corticosteroides agem suprimindo a atividade do sistema imune que destrói as plaquetas.
Importante: Os corticosteroides podem ter efeitos colaterais significativos com uso prolongado, como aumento de peso, pressão alta, diabetes, osteoporose e distúrbios de humor.
1.2. Imunoglobulina Humana Intravenosa (IgIV):
Atua modulando rapidamente a resposta imune. É frequentemente usada em situações de emergência com sangramento grave, ou quando há necessidade de um aumento rápido na contagem de plaquetas (por exemplo, antes de uma cirurgia).
Dose: de 0,8 a 1 g/kg/dia por 1 a 2 dias.
É utilizada quando há necessidade de um aumento rápido das plaquetas (por exemplo, em casos de sangramento ativo, pré-cirúrgico ou em PTI grave), ou quando os corticosteroides são contraindicados. A resposta é rápida (24-48 horas), mas temporária e tem alto custo.
1.3. Imunoglobulina Anti-D (Rhophylac, WinRho SDF):
Pode ser uma opção para pacientes Rh positivos não esplenectomizados. Age cobrindo os glóbulos vermelhos Rh positivos, que são então destruídos pelo baço, "distraindo" o sistema imune da destruição das plaquetas.
Cuidado: Pode causar hemólise (destruição de glóbulos vermelhos) e não é indicada em todos os casos.
Doses Típicas
As doses da Imunoglobulina anti-D para PTI são geralmente administradas por via intravenosa (EV) ou, em alguns casos, intramuscular (IM), e variam conforme o protocolo médico:
Dose única: 50 a 75 mcg/kg (microgramas por quilograma de peso corporal), em uma dose única.
Doses fracionadas: 25 mcg/kg/dia por 2 dias.
2. Tratamento de Segunda Linha
Considerado para pacientes que não respondem adequadamente à terapia de primeira linha, que recidivam após o tratamento inicial, ou que necessitam de doses altas de corticosteroides para manter as plaquetas em níveis seguros.
Esplenectomia (Remoção do Baço):
O baço é o principal local de destruição das plaquetas na PTI. A esplenectomia é uma opção eficaz para muitos pacientes, levando à remissão duradoura em cerca de 60-70% dos casos. Geralmente é considerada após falha da terapia medicamentosa e, se possível, após os primeiros 12 meses de diagnóstico para permitir a chance de remissão espontânea (embora em adultos, a remissão espontânea seja rara).
Requer vacinação prévia contra certas bactérias (pneumococo, meningococo, Haemophilus influenzae) devido ao risco aumentado de infecções pós-esplenectomia.
Vantagem: Potencial para cura ou remissão prolongada.
Desvantagens: É um procedimento cirúrgico com riscos (infecção, trombose) e requer vacinação prévia contra certas bactérias (pneumococo, meningococo, Haemophilus influenzae) para prevenir infecções pós-esplenectomia.
Agonistas do Receptor de Trombopoetina (ATPOs):
Estimulam a medula óssea a produzir mais plaquetas. São medicamentos orais ou injetáveis que podem ser usados a longo prazo.
Eltrombopague (Revolade): Oral.
Romiplostim (Nplate): Injetável subcutâneo.
Dose do Eltrombopague : inicial: 50 mg, via oral, uma vez ao dia.Para pacientes de ascendência asiática ou com insuficiência hepática, a dose inicial recomendada é de 25 mg, uma vez ao dia. A dose é ajustada gradualmente para manter a contagem de plaquetas entre 50.000 e 200.000/mm³, com uma dose máxima de 75 mg/dia. O ajuste de dose é semanal, conforme a resposta.
Dose do Romiplostim - inicial: 1 mcg/kg (micrograma por quilograma de peso corporal), administrada uma vez por semana, por injeção subcutânea. A dose é ajustada semanalmente em incrementos de 1 mcg/kg para atingir e manter a contagem de plaquetas entre 50.000 e 200.000/mm³.A dose máxima não deve exceder 10 mcg/kg por semana.
Vantagem: Aumentam a produção de plaquetas, reduzindo a necessidade de outras terapias.
Desvantagem: Requerem uso contínuo, podem ter efeitos colaterais como dor de cabeça, dor muscular e, raramente, aumento do risco de trombose ou mielofibrose (cicatrização da medula óssea).
Rituximabe (MabThera):
É um anticorpo monoclonal que atua destruindo os linfócitos B, que são as células que produzem os anticorpos anti-plaquetas. Pode ser usado como uma alternativa à esplenectomia ou após sua falha.
Administração: Intravenosa.
Dose : 375 mg/m² (por área de superfície corporal) uma vez por semana, por 4 semanas consecutivas. Existe também um esquema de dose fixa de 100 mg por semana por 4 semanas, ou 1g nos dias 1 e 15 (apenas 2 doses).
Vantagem: Pode induzir remissão em alguns pacientes.
Desvantagem: Efeitos colaterais relacionados à infusão e imunossupressão.
3. Outras Terapias (para PTI Crônica e Refratária)
Para pacientes que não respondem às terapias de primeira e segunda linha, ou que apresentam recorrência da doença, outras opções imunossupressoras podem ser consideradas, embora com taxas de resposta mais variáveis e mais efeitos colaterais.
Ácido Micofenólico (CellCept): Imunossupressor que pode ser usado em casos refratários.
Dose inicial: 10 a 20 mg/kg/dia, dividida em duas administrações (oral), 12/12 horas.
Azatioprina: Imunossupressor de uso oral.
Dose inicial: 1 a 3 mg/kg/dia, por via oral. A dose de manutenção é ajustada conforme a resposta clínica e a tolerância hematológica.
Ciclofosfamida: Agente quimioterápico com efeito imunossupressor, usado em casos selecionados e graves.
Dose: Varia bastante. Pode ser de 1 a 2 mg/kg/dia por via oral, ou em pulsos intravenosos de 300 a 1000 mg/m² a cada 2-4 semanas
Ciclosporina
Dose: Geralmente entre 2,5 a 5 mg/kg/dia, dividida em duas doses diárias (oral). A dose é ajustada com base nos níveis sanguíneos do medicamento e na função renal.
Dapsona: Um antibiótico com propriedades imunomoduladoras.
Dose típica: 100 mg/dia, por via oral. Pode ser ajustada individualmente
Fostamatinibe: Inibidor da tirosina-quinase do baço (SYK), que inibe a destruição de plaquetas.
Manejo em Casos Específicos
PTI Recém-Diagnosticada (até 3 meses): O tratamento é iniciado apenas se houver sangramento clinicamente significativo ou contagem de plaquetas muito baixa. A observação é uma opção para pacientes assintomáticos com plaquetas acima de 20.000-30.000/mm³.
PTI Persistente (3-12 meses): Se a contagem de plaquetas permanece baixa, mas sem sangramento grave, pode-se continuar monitorando ou considerar a intensificação do tratamento.
PTI Crônica (mais de 12 meses): Nesses casos, busca-se um tratamento que permita o controle a longo prazo da contagem de plaquetas com o mínimo de efeitos colaterais.
Fonte
https://www.saude.mt.gov.br/storage/old/files/pcdt-de-purpura-trombocitopenica-idiopatica-[641-040919-SES-MT].pdf
https://hcrp.usp.br/revistaqualidade/uploads/Artigos/206/206.pdf
https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/protocolos/resumidos/pcdt_resumido_purpuraidiopaticatrombocitopenica.pdf