FEBRE TIFÓIDE - DIAGNÓSTICO
Considerações iniciais
A Febre Tifoide é uma doença bacteriana aguda, causada pela Salmonella enterica sorotipo Typhi, de distribuição mundial. A doença está diretamente associada a baixos níveis socioeconômicos, principalmente em regiões com precárias condições de saneamento básico, higiene pessoal e ambiental. Se não tratada adequadamente, a Febre Tifoide pode matar. Nesse contexto, a Febre Tifoide está praticamente eliminada de países onde esses problemas foram superados. No Brasil, a doença ocorre sob a forma endêmica em regiões isoladas, com algumas epidemias onde as condições de vida são mais precárias, especialmente nas regiões Norte e Nordeste.
A infecção recorrente por Salmonella é uma das condições clínicas marcadoras da AIDS/HIV. Em regiões onde a bactéria causadora da Febre Tifoide é endêmica, a incidência da doença pode ser de 25 a 60 vezes maior entre indivíduos HIV positivos que em soronegativos. Os indivíduos HIV positivos assintomáticos podem apresentar doença semelhante ao imunocompetente e boa resposta ao tratamento usual. Doentes com aids (doença definida) podem apresentar Febre Tifoide particularmente grave e com tendência a recaídas. Em áreas endêmicas, acomete com maior frequência indivíduos de 15 a 45 anos e a taxa de ataque diminui com a idade.
TRANSMISSÃO
A transmissão da Febre Tifoide pode ocorrer de duas maneiras principais:
pela forma direta: contato com as mãos do doente ou portador;
pela forma indireta: ingestão de água ou de alimentos contaminados com fezes ou urina.
A contaminação de alimentos geralmente acontece pela manipulação por portadores ou pacientes oligossintomáticos (com manifestações clínicas discretas), que não são afastados das atividades de preparo dos alimentos. Legumes irrigados com água contaminada, frutos do mar (crustáceos e moluscos) retirados de água poluída e consumidos mal cozidos ou crus, leite e derivados não pasteurizados, produtos congelados e enlatados também podem veicular salmonelas.
O indivíduo infectado elimina a bactéria nas fezes e na urina, independentemente de apresentar os sintomas da doença. O tempo de eliminação da bactéria varia de uma a três semanas, podendo chegar a três meses. Entre 2 a 5% dos pacientes transformam-se em portadores crônicos da Febre Tifoide e podem transmitir a doença por até um ano.
SINTOMAS
Para febre tifoide, o período de incubação (em geral de 8 a 14 dias) está inversamente relacionado com o número de microrganismos ingeridos.
Sintomas gerais - O início é geralmente gradual, com febre, cefaleia, artralgia, faringite, constipação intestinal, anorexia e sensibilidade e dor abdominais. Sintomas menos comuns incluem disúria, tosse não produtiva e epistaxe. Pode apresentar Esplenomegalia.
Febre - Sem tratamento, a temperatura sobe gradualmente ao longo de 2 a 3 dias, permanece elevada (em geral, 39,4 a 40° C) durante outros 10 a 14 dias, começa a cair gradualmente no final da 3ª semana e alcança níveis normais durante a 4ª semana. Febre prolongada é acompanhada frequentemente por bradicardia relativa e prostração.
Sintomas do sistema nervoso central como delirium, estupor, ou coma ocorrem em casos graves.
Exantemas - Em aproximadamente 10 a 20% dos pacientes, lesões cor-de-rosa discretas e esbranquiçadas (manchas róseas) aparecem em surtos no tórax e no abdome durante a 2ª semana e se resolvem em 2 a 5 dias.
Alterações intestinais - posteriormente na doença, quando lesões intestinais são muito proeminentes, uma diarreia rosada pode ocorrer e as fezes podem conter sangue (oculto em 20%, evidente em 10%). Em aproximadamente 2% dos pacientes, sangramento grave ocorre durante a 3ª semana, com uma taxa de mortalidade de cerca de 25%. Abdômen agudo e leucocitose durante a 3ª semana podem sugerir perfuração intestinal, que geralmente compromete o segmento distal do íleo e ocorre em 1 a 2% dos pacientes.
Alteração pulmonar - Pneumonia pode se desenvolver durante a segunda ou 3ª semana e pode ocorrer por causa de infecção pneumocócica secundária, embora a próprio S. typhi também possa causar pneumonia.
Infecções outros sítios - Bacteremia ocasionalmente conduz a infecções focais como osteomielite, endocardite, meningite, abscesso de tecido mole, glomerulite, ou envolvimento do trato geniturinário.
Evolução do quadro
A convalescença pode durar vários meses. Sinais e sintomas semelhantes à síndrome clínica inicial recorrem aproximadamente 2 semanas após a defervescência em 8 a 10% dos pacientes sem tratamento para febre tifoide. Por motivos obscuros, a terapia antibiótica durante a doença inicial aumenta a incidência de recorrência febril em 15 a 20% dos casos. Se os antibióticos são reiniciados no momento da recorrência, a febre cede rapidamente, ao contrário da defervescência lenta, a qual ocorre durante a doença primária. Ocasionalmente, uma 2ª recorrência ocorre.
EXAME LABORATORIAL
Leucopenia, anemia, anormalidades da função hepática, proteinúria e coagulopatia de consumo discreta são comuns. Colecistite aguda e hepatite podem ocorrer.
COMPLICAÇÕES
A hemorragia intestinal, principal complicação da Febre Tifoide, pode levar, inclusive à perfuração intestinal, o que requer maior cuidado médico.
Qualquer órgão pode ser afetado pela Febre Tifoide, quando a doença evolui com bacteremia e outras complicações menos frequentes são:
retenção urinária;
pneumonia;
colecistite.
Nas crianças, a doença costuma ser menos grave do que nos adultos, sendo acompanhada frequentemente de diarreia. Embora seja uma doença aguda, a febre tifoide evolui gradualmente e a pessoa afetada, muitas vezes, é medicada com antimicrobianos, simplesmente por estar apresentando uma febre de etiologia não conhecida. Dessa forma, o quadro clínico fica mascarado e a doença deixa de ser diagnosticada precocemente.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da Febre Tifoide é feito com base na avaliação clínica do paciente, histórico de onde esteve e o que consumiu, nos hábitos de higiene e se vive em regiões com pouco saneamento básico ou não.
Culturas
Devem ser obtidas culturas de sangue, fezes e urina. Como a resistência a fármacos é comum, testes padrão de sensibilidade são essenciais. O teste de sensibilidade a ácido nalidíxico como triagem não é recomendado porque ele não prevê de forma confiável a sensibilidade ao ciprofloxacino.
Culturas de sangue geralmente só são positivas durante as primeiras 2 semanas da doença, mas culturas de fezes com frequência são positivas durante a 3ª à 5ª semana. Se essas culturas forem negativas e a febre tifoide for fortemente suspeita, cultura de uma amostra de biópsia de medula óssea pode revelar o microrganismo.
Imunológico - Bacilos tifoides contêm antígenos O e H que estimulam o hospedeiro a formar anticorpos correspondentes. Uma elevação de 4 vezes nos títulos de anticorpos O e H em amostras obtidas com intervalo de 2 semanas sugere infecção por S. Typhi (teste de Widal). Porém, esse teste é apenas moderadamente (70%) sensível e não é específico; muitas cepas de Salmonella não tifoides têm reação cruzada e a cirrose hepática provoca um exame falso-positivo
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Com base nos sintomas tradicionais, que podem se confundir com os de outras doenças, como infecções por Salmonella entérica sorotipo Paratyphi ou doenças que apresentam febre prolongada ( pneumonias, tuberculose, meningite, doença de chagas, malária, toxoplasmose, esquistossomose). Outras infecções que podem ser confundidas, são riquetsioses, leptospirose, brucelose, tularemia, hepatite infecciosa, psitacose, infecção enterocolitica por Yersinia e linfoma.
Fontes