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Dislipidemia - critério diagnóstico

Considerações iniciais

A diretriz foi revisada e aprovada pela SBC em 2025. Ela alinha-se em muitos aspectos às diretrizes internacionais (ESC/EAS), mas adapta metas e abordagem à realidade brasileira (acesso a medicamentos, custos, população). Destaca-se a criação de uma nova categoria de risco “extremo”, com meta de LDL-C particularmente agressiva para pacientes com múltiplos eventos cardiovasculares. 

O LDL-C (colesterol de lipoproteína de baixa densidade) continua sendo o alvo primário, e o não-HDL-C como alvo coprimário, com metas progressivas conforme o nível de risco. Também enfatiza uso precoce de terapias combinadas, quando a estatina de alta intensidade sozinha não for suficiente para atingir a meta.

 

Valores de referência nos exames

- Triglicerídeos

Em relação ao diagnóstico das dislipidemias,  os exames não precisam ser coletados em jejum, exceto quando o triglicérides (TG) apresenta valores maiores que 440mg/dL, situação na qual o exame deve ser repetido em jejum, para confirmar a alteração.  

Além disso, os níveis de TG muito aumentados interferem no resultado do LDL, calculado a partir de fórmulas específicas. O corte para o TG ficou estabelecido em 150mg/dL quando em jejum e 175mg/dL quando sem jejum.  

Já os valores de LDL, não HDL, Apolipoproteína B (apoB) e lipoproteína(a) são semelhantes em jejum ou sem.

 

- LDL e não-HDL

Houve mudanças nos cortes de LDL e não HDL para os pacientes de baixo risco, agora com valores de corte de 115mg/dL e 145mg/dL respectivamente.

Pacientes de risco intermediário tem valores de corte de LDL e não HDL de 100mg/dL e 130mg/dL, risco alto de 70mg/dL e 100mg/dL, muito alto de 50mg/dL e 80mg/dL e risco extremo de 40mg/dL e 70mg/dL. 

 

- Apolipoproteína B - ApoB

A ApoB é a principal proteína estrutural presente nas lipoproteínas aterogênicas, atuando como ligante para o receptor do LDL. Sua dosagem fornece uma estimativa direta da concentração total de partículas lipídicas aterogênicas plasmáticas, já que existe uma única molécula de ApoB em cada lipoproteína aterogênica: LDL, VLDL, IDL e Lp(a). Na população geral, as concentrações de LDL-c e ApoB estão altamente correlacionadas, e, portanto, em geral fornecem informações semelhantes sobre o risco de DCVA. Por outro lado, em indivíduos com diabetes, obesidade ou síndrome metabólica, frequentemente associados a níveis elevados de TG, a mensuração isolada do LDL-c pode subestimar a concentração total de lipoproteínas contendo ApoB.

A explicação para essa situação é que na presença de níveis elevados de TG, parte do colesterol nas partículas de LDL é substituída por TG, promovendo a produção de partículas pequenas e densas de LDL. Estas partículas, mais aterogênicas, tornam a quantidade de colesterol no LDL um reflexo não confiável do número de partículas de LDL.

A Apolipoproteína B (apoB) foi incluída como forma de diagnóstico de dislipidemias e estratificação de risco por ter grande correlação com o LDL e caso o TG seja muito alto por exemplo, a apoB é um bom preditor de eventos e pode ser considerada como escolha para diagnóstico. Caso o TG seja muito alto e não haja disponibilidade de dosagem de apoB, sugere-se a avaliação pelo valor do colesterol não HDL.  A apoB também tem valores de corte específicos a depender do risco: quando baixo o corte é 100mg/dL, intermediário é 90mg/dL, alto 70mg/dL, muito alto 55mg/dL e extremo 45mg/dL.

 

- Lipoproteína A - Lp(a)

A Lp(a) é uma partícula semelhante à LDL, na qual a ApoB é covalentemente ligada a uma molécula denominada apolipoproteína(a). Além dos efeitos pró-aterogênicos, a Lp(a) tem efeitos pró-inflamatórios, provavelmente relacionados a sua carga de fosfolipídios oxidados, e a apolipoproteína(a) se assemelha ao plasminogênio, o que levanta a possibilidade de efeitos pró-trombóticos. As concentrações plasmáticas de Lp(a) não são influenciadas por dieta, idade, sexo, estado de jejum ou estilo de vida, sendo amplamente (> 90%) determinadas geneticamente. Os valores individuais são geralmente estáveis ao longo da vida e, portanto, medidas repetidas não são necessárias para avaliação de risco. A determinação da Lp(a) é desafiadora, pois existe variação entre os métodos analíticos, em parte relacionada à estrutura da apolipoproteína(a), que pode ser amplamente variável em tamanho.

Já a Lipoproteína A [Lp(a)] deve ser dosada pelo menos uma vez na vida em todos os pacientes. Ela é determinada geneticamente e não apresenta variação ao longo do tempo. Quando o paciente tem valores acima do corte citado, seu risco cardiovascular é aumentado.  Por fim, os cortes para considerar Lp(a) alterada são 75nmol/L ou 30mg/dL.  

 

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Classificação de risco

Em relação a estratificação de risco, o escore escolhido foi o escore PREVENT.  

A diretriz recomenda usar o SCORE2 e SCORE2-OP (para jovens e idosos, respectivamente), que substituem o antigo Framingham. A avaliação de marcadores de risco adicionais: Cálcio coronariano (CAC score), Lipoproteína(a) [Lp(a)], hs-CRP (PCR ultrassensível), História familiar de DAC precoce

Os pacientes são classificados em risco baixo, intermediário, alto, muito alto ou extremo.

Evento cardiovascular maior foi definido como síndrome coronariana aguda (SCA) recente (últimos 12 meses), histórico de infarto agudo do miocárdio (IAM), de acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico ou doença arterial periférica sintomática.   

 

🔹 Risco baixo

Pacientes de baixo risco são os com risco calculado < 5% em 10 anos, com ausência de agravantes de risco e ausência de diabetes. 

Indivíduos jovens, sem fatores de risco relevantes.

Escore de risco global baixo (p. ex. SCORE2 < 5%).

Meta de LDL-C: < 115 mg/dL.

 

🔹 Risco intermediário

Pacientes de risco intermediário são os com risco calculado entre 5 e 20% em 10 anos, sem agravantes de risco, risco calculado baixo (< 5% em 10 anos) com presença de agravante de risco, diabetes em homens com < 50 anos, mulheres < 56 anos, sem estratificadores de alto ou muito alto risco, LDL entre 160 e 189mg/dL.

 

Presença de 1–2 fatores de risco (tabagismo, HAS, dislipidemia leve).

SCORE2 entre 5–10%.

Meta de LDL-C: < 100 mg/dL.

 

🔹 Risco alto

Condições de alto risco foram definidos como idade maior ou igual a 65 anos, hipercolesterolemia familiar, histórico de cirurgia de revascularização miocárdica ou intervenção coronária percutânea fora de evento, diabetes, hipertensão, doença renal crônica, tabagismo, LDL persistentemente elevado apesar de terapia otimizada ou evento aterosclerótico há menos de 2 anos. 

Pacientes de alto risco são os com escore de risco calculado ≥ 20% em 10 anos, pacientes com risco intermediário e mais um fator agravante de risco, portadores de aterosclerose subclínica, LDL ≥ 190mg/dL, diabetes em homem ≥ 50 anos, mulher ≥ 56 anos, 1 ou 2 estratificadores de alto risco, sem estratificadores de muito alto risco, Lp(a) > 180mg/dL. 

 

Diabetes mellitus sem lesão de órgão-alvo.

Pacientes com doença renal crônica leve a moderada (TFG 30–59 mL/min).

SCORE2 10–20%.

Meta de LDL-C: < 70 mg/dL.

 

🔹 Risco muito alto

Pacientes com doença aterosclerótica significativa ou evento aterosclerótico manifesto, escore de cálcio maior que 300 ou diabetes com estratificadores de muito alto risco ou pelo menos 3 estratificadores de risco são classificados como de muito alto risco.  

Doença aterosclerótica documentada (IAM, AVC isquêmico, revascularização, aterosclerose em grandes vasos).

Diabetes com lesão de órgão-alvo ou múltiplos fatores de risco.

Doença renal crônica avançada (TFG < 30 mL/min).

SCORE2 > 20%.

Meta de LDL-C: < 50 mg/dL.

🔹 Risco extremo (nova categoria SBC 2025) 🚨

Pacientes com múltiplos eventos cardiovasculares ateroscleróticos recorrentes.

Progressão rápida de aterosclerose mesmo sob tratamento otimizado.

Meta de LDL-C: < 40 mg/dL.

Pacientes com histórico de múltiplos eventos cardiovasculares maiores ou um evento cardiovascular maior associado a duas ou mais condições de alto risco são classificados como tendo risco extremo.  

 

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Os estratificadores de alto risco no diabetes são diabetes há mais de 10 anos, história familiar de doença coronária prematura, síndrome metabólica, hipertensão arterial, tabagismo ativo, neuropatia autonômica cardiovascular incipiente, retinopatia diabética não proliferativa leve, doença renal de alto risco, escore de cálcio entre 10 e 300, placa em carótida menor que 50%, angiotomografia de coronárias com placa menor que 50% ou aneurisma de aorta abdominal.  

Já os estratificadores de muito alto risco no diabetes são divididos pelo tipo de pacientes

  • Sem evento cardiovascular aterosclerótico manifesto prévio de muito alto risco: 3 ou mais estratificadores de alto risco, diabetes tipo 1 com mais de 20 anos, iniciado após os 18 anos, estenose maior que 50% em qualquer território vascular, risco aumentado por doença renal, hipercolesterolemia grave (colesterol total maior que 310mg/dL ou LDL maior que 190mg/dL), neuropatia autonômica cardiovascular instalada ou retinopatia diabética não proliferativa moderada ou grave, proliferativa ou evidência de progressão. 
  • Com evento cardiovascular aterosclerótico manifesto prévio: SCA, IAM antigo ou angina estável, AVC isquêmico ou ataque isquêmico transitório, revascularização coronariana, carotídea, renal ou periférica, insuficiência vascular periférica ou amputação de membros.  

Fontes 

https://portal.afya.com.br/cardiologia/sbc-2025-nova-diretriz-brasileira-de-dislipidemias?login_success=true

https://abccardiol.org/wp-content/uploads/2025/09/2025-0640_Diretriz-Brasileira-de-Dislipidemias-e-Prevencao-da-Aterosclerose-%E2%80%93-2025_Port.x66747.pdf