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CÀNCER DE MAMA - AVALIAÇÃO INICIAL

Considerações iniciais

O manejo inicial de uma paciente com diagnóstico de câncer de mama após biópsia, segue um protocolo estruturado. Os principais tipos de câncer de mama são divididos em não invasivos (in situ) e invasivos, além de subclasses especiais.

 1. CLASSIFICAÇÃO HISTOLÓGICA

A) CARCINOMAS NÃO INVASIVOS (IN SITU)

Estão restritos aos ductos ou lóbulos, sem invadir o estroma.

A.1. Carcinoma ductal in situ (CDIS / DCIS)

O mais comum.

Precursor de carcinoma invasivo.

A.2. Carcinoma lobular in situ (CLIS / LCIS)

Mais marcador de risco do que pré-câncer.

Aumenta risco bilateral.

 

B. CARCINOMAS INVASIVOS (INFILTRATIVOS)

B.1. Carcinoma ductal invasivo (CDI) — 70–80%

O tipo invasivo mais comum.

Grande variedade de graus e padrões.

B.2. Carcinoma lobular invasivo (CLI) — 10–15%

Crescimento “em fila indiana”.

Multifocal e bilateral com maior frequência.

 

C. TIPOS HISTOLÓGICOS ESPECIAIS

São menos comuns, porém importantes por terem prognóstico e comportamento específicos.

C.1. Carcinoma tubular

Geralmente RE+

Prognóstico muito bom.

C.2. Carcinoma mucinoso (colóide)

Produção abundante de muco.

Prognóstico favorável.

C.3. Carcinoma cribriforme

Arquitetura em “peneira”.

Bom prognóstico.

C.4. Carcinoma medular / medular‐like

Associado a BRCA1.

Tumor “foliáceo”, circunscrito.

C.5. Carcinoma papilífero

Pode ser in situ ou invasivo.

Mais comum em mulheres idosas.

C.6. Carcinoma micropapilífero

Tendência a metástases linfáticas.

C.7. Carcinoma metaplásico

Contém áreas escamosas ou sarcomatoides.

Raro, agressivo, geralmente triplo-negativo.

C.8. Carcinoma apócrino

Células com citoplasma granular eosinofílico.

Muitas vezes AR+ (receptor androgênico).

C.9. Carcinoma secretor

Raro, visto em jovens.

Associado à fusão ETV6-NTRK3.

C.10. Carcinoma adenoide cístico

Semelhante ao tumor adenoide cístico salivar.

Prognóstico muito bom.

C.11. Carcinoma inflamatório

Não é um tipo histológico, mas uma apresentação clínica agressiva.

Pele com aspecto de “casca de laranja”.

 

2. CONFIRMAÇÃO DO LAUDO

Antes de qualquer conduta definitiva, é necessário confirmar no laudo da biópsia:

2.A – É carcinoma ductal in situ (CDIS / DCIS)?

→ Lesão não invasiva.

2.B – É carcinoma ductal invasivo (CDI)?

→ Tumor maligno invasivo, comportamento muito diferente.

2.C – Marcadores obrigatórios no laudo:

  • Receptor de estrogênio (RE)
  • Receptor de progesterona (RP)
  • HER2
  • Ki-67
  • Grau histológico.

Sem isso, o estadiamento e o tratamento não podem ser definidos. O diagnóstico molecular do câncer de mama é feito principalmente por imuno-histoquímica (IHQ) e, em alguns casos, por testes genéticos/moleculares adicionais (FISH, PCR, painéis NGS). Ele determina o subtipo molecular, que é fundamental para definir o tratamento.

Imuno-histoquímica – o núcleo do diagnóstico molecular

É realizada no fragmento da biópsia e fornece os marcadores essenciais:

(1) Receptor de Estrogênio – RE (ER)

Positivo se ≥ 1% das células tumorais expressarem.

Indica benefício de hormonioterapia (tamoxifeno ou inibidor de aromatase).

(2) Receptor de Progesterona – RP (PR)

Positivo se ≥ 1%.

Aumenta a sensibilidade à hormonioterapia.

(3) HER2

Determina se o tumor é HER2-positivo, que muda completamente o tratamento.

Classificação por IHQ:

0 ou 1+ → HER2 negativo

2+ (equívoco) → exige FISH

3+ → HER2 positivo

(4) Ki-67

Índice de proliferação celular.

Ajuda a diferenciar Luminal A (baixo) de Luminal B (alto).

 Teste FISH (Hibridização in situ fluorescente)

Feito quando o HER2 é 2+ (indeterminado) na imuno-histoquímica.

Quantifica a amplificação do gene ERBB2 (HER2).

Resultado:

Amplificado → HER2+

Não amplificado → HER2−

🧪 Testes genômicos multigênicos (quando há CDI invasivo)

Usados para decidir se quimioterapia é necessária, principalmente em tumores luminais (RE+).

Principais:

(1) Oncotype DX

Mais usado nos EUA e em diretrizes internacionais.

Calcula um “score de recorrência”.

Define se quimioterapia adjuvante é benéfica.

(2) MammaPrint

Classifica tumores em baixo ou alto risco genômico.

Pode dispensar quimioterapia em casos de baixo risco.

(3) Prosigna (PAM50)

Classifica o tumor conforme perfil de 50 genes:

Luminal A

Luminal B

HER2-enriched

Basal-like

No Brasil, esses testes existem mas são privados e caros

3. ESTADIAMENTO – O PASSO SEGUINTE EM QUALQUER DOS DOIS CASOS

Após o diagnóstico histológico, o estadiamento é:

  • Mamografia bilateral
  • Ultrassom de mamas e axilas
  • Ressonância magnética das mamas (muito recomendada para pacientes jovens)
  • Para avaliar metástases (se tumor invasivo ou lesão grande):

- TC de tórax/abdome/pelve

- Cintilografia óssea ou PET-CT

 

4. MANEJO TERAPÊUTICO

🟦 SE FOR CARCINOMA DUCTAL IN SITU (DCIS)

Doença não invasiva, estádio 0.

Tratamento:

Cirurgia

Setorectomia (cirurgia conservadora) + radioterapia adjuvante

(padrão, se a margem cirúrgica for adequada)

OU Mastectomia total

(para lesões grandes, multicêntricas ou quando não há possibilidade de margens seguras)

Pesquisa de linfonodo sentinela?

Não é necessária — exceto se houver indicação de mastectomia (porque não haverá acesso depois).

Terapia hormonal adjuvante

(Se RE/RP positivos)

Tamoxifeno por 5 anos

(ou inibidor de aromatase em mulheres pós-menopausa)

❌ Quimioterapia não é indicada no DCIS.

 

🟥 SE FOR CARCINOMA DUCTAL INVASIVO (CDI)

A conduta depende de:

Tamanho do tumor

Comprometimento linfonodal

Subtipo molecular (Luminal A, Luminal B, HER2+, triplo-negativo)

 

 Tratamento padrão no CDI (invasivo)

1. Cirurgia

duas opções:

Cirurgia conservadora (quadrantectomia) + radioterapia

Mastectomia total

2. Estadiamento axilar

Biópsia de linfonodo sentinela

Se positivo → esvaziamento axilar (dependendo do número de linfonodos comprometidos)

 

 3.Terapias adjuvantes (dependem do subtipo)

➡ Tumores RE/RP positivos

Hormonioterapia (Tamoxifeno ou inibidor de aromatase)

Podem receber quimioterapia dependendo do Ki-67 e tamanho.

 

🟦 LUMINAL A

RE positivo - RP positivo - HER2 negativo

Ki-67 baixo (< 14–20%) 💊 → Principal tratamento: hormonioterapia.

 

🟧 LUMINAL B

RE positivo - RP baixo/negativo - HER2 positivo ou negativo

Ki-67 alto 💊 → Pode precisar de quimioterapia + hormonioterapia.

 

➡ Tumores HER2 positivos

Necessitam: QuimioterapiaTrastuzumabe por 1 ano

 

🟥 HER2-ENRICHED

HER2 positivo (3+ ou FISH+)

RE e RP negativos💊 → Necessário tratamento anti-HER2 (trastuzumabe ± pertuzumabe).

 

➡ Tumor triplo-negativo

Quimioterapia obrigatória

Avaliar imunoterapia (pembrolizumabe) dependendo do estadiamento.

 

TRIPLO-NEGATIVO

RE negativo - RP negativo - HER2 negativo 💊 → Quimioterapia é o tratamento central.

(Para doença localmente avançada: quimio + imunoterapia → pembrolizumabe

 

4. Radioterapia

Indicada para:

Cirurgia conservadora

Mastectomia com tumor >5 cm, margens ruins ou linfonodos positivos

🧬 5. Testes genéticos germinativos (obrigatórios em pacientes jovens)

Para toda paciente < 45 anos com câncer de mama, recomenda-se teste genético para mutações hereditárias:

BRCA1

BRCA2

TP53 (síndrome de Li-Fraumeni — muito relevante em paciente de 27 anos)

PALB2

CHEK2

ATM

Outros de acordo com painel

Esses testes são feitos por NGS (sequenciamento de nova geração).

Resultado impacta: Tipo de cirurgia (ex.: considerar mastectomia bilateral profilática em mutações BRCA)

Vigilância

Tratamento (ex.: olaparibe para BRCA mutado)

Fontes 

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KASTNER, M.; SCHETTINO, A.; GUERRA, S. O.; CASTRO, O. F. de. Determinação de Receptores Hormonais em Câncer de Mama: Método Histoquímico. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 29, n. 3, p. 32-39, 1983. Disponível em: https://rbc.inca.gov.br/index.php/revista/article/view/4312.

EISENBERG, A. L. A.; KOIFMAN, S. Câncer de Mama: Marcadores Tumorais (Revisão de Literatura). Revista Brasileira de Cancerologia, v. 47, n. 4, 2001. Disponível em: https://rbc.inca.gov.br/index.php/revista/article/view/2300

ROSA, K. G. et al. A importância da classificação molecular no prognóstico do câncer de mama: perspectivas atuais. Revista Eletrônica da Faculdade Evangélica de Ceres, v. 10, n. 1, 2023. DOI: https://doi.org/10.37951/refacer.v10i1.5879

GOMES, K.; SILVA, L.; LAFRATTA, R. Técnicas para o diagnóstico molecular de câncer de mama e genes BRCA1, BRCA2 e proteína HER2. Revista FT, 2025. DOI:10.5281/zenodo.11193412. 

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