SEPSE - MANEJO
Considerações iniciais
Sepse pode ser definida como a resposta sistêmica a uma doença infecciosa (provável ou confirmada), seja ela causada por bactérias, vírus, fungos ou protozoários. (definição antiga) ou uma resposta desregulada a infecção levando a disfunção orgânica (definição atual).
Sepse refratária à reposição volêmica com necessidade de vasopressor para manter PAM >= 65 mmHg, com lactato arterial > 2mmol/L.
Quadro clínico :
- Quadro clínico é bem diverso, variando com gravidade, foco infeccioso, idade do paciente e comorbidades;
- Achados gerais: febre, hipotensão, taquicadia, aumento do tempo de nchimento capilar, taquipneia, dispneia, agitação, confusão mental, oligúria, desconforto abdominal, icterícia e outros.
Quanto aos principais focos: respiratório, urinário e abdominal. Além dela, temos as envolvendo partes moles, óssea, acessos venosos e dispositivos, neurológicas e endocardite.
Diagnóstico:
Em 2016 publicação do JAMA (SEPSIS 3) sugeriu mudança na definição da sepse. Como ainda não é bem estabelecido aderirmos a essas mudanças, devemos conhecer os 2 conceitos e aplica-los com bom senso. Usando os critérios do Surviving Sepsis Campaign (SSC) 2012 e ILAS (Instituto Latino Americano de Sepse) 2015, temos:
- Síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS), que é definida por 2 ou mais dos 4 critérios abaixo:
Temperatura > 38,3°C ou < 36,0°C (Temperatura central);
FC > 90 bpm;
FR > 20ipm ou PaCO2 < 32 mmHg ou necessidade de ventilação mecânica;
Leucócitos > 12.000/mm ou < 4.000/mm ou > 10% de formas imaturas.
- Sepse: SIRS e infecção documentada ou presumida.
- Sepse grave: disfunção orgânica induzida pela própria sepse. Os critérios podem ter pequenas variações conforme a referência, sendo importante conhecer as manifestações clínicas e os critérios segundo Surviving Sepsis Campaign 2012.
- Choque séptico: sepse grave com hipotensão arterial refratária à reposição volêmica, sendo necessário uso de drogas vasoativas.
A tendência será manter os critérios antigos de SIRS, mas não utilizar mais o conceito de SEPSE GRAVE.
COMO SUSPEITAR DE SEPSE?
- Suspeita clinica pela história e exame OU ter 2 de 3 critérios do Quick SOFA (FR ≥ 22rpm; alteração mental; PAS ≤ 100mmHg).
- Tendo suspeita, aplica-se o SOFA. Sepse será um aumento de pelo menos 2 pontos em relação ao SOFA basal do paciente;
• Choque séptico na nova proposta seria PAM < 65mmHg, com necessidade de drogas vasoativas E lactato elevado;
O que é lactato “elevado”?
Níveis elevados de lactato não são definidos de forma clara e universal, mas a maioria dos estudos usa valores de corte de 2,0 a 2,5 mmol/L; enquanto níveis “altos” de lactato foram definidos como superiores a 4,0 mmol/L em vários estudos. Além disso, o “valor normal” pode variar dependendo do ensaio utilizado.
Os termos lactato e ácido lático são frequentemente usados como sinônimos, mas o lactato (o componente medido no sangue); é estritamente uma base fraca, enquanto o ácido lático é o ácido correspondente.
A acidose láctica é frequentemente usada clinicamente para descrever níveis elevados de lactato, mas deve ser reservada para casos em que há uma acidose correspondente (pH < 7,35).
Exames Complementares:
• Gerais
- Hemograma completo;
- Ureia e Creatinina e Eletrólitos;
- Glicemia;
- TP, TTPa. Caso suspeite de CIVD, incluir fibrinogênio e d-dímero o bilirrubina;
- Gasometria arterial e Lactato;
- Proteína C reativa;
- Urina Rotina;
- Raio X de tórax.
• Culturas
- Colher pelo menos 2 Hemoculturas antes do início de antibioticoterapia (caso a coleta possa atrasar o antibiótico, dar preferência para a medicação);
- Outras culturas podem ser colhidas a depender da suspeita clínica.
+Tratamento:
Medidas Gerais:
Obter acesso venoso, suplementação de oxigênio e monitorização;
Ressuscitação inicial - seguindo o pacote das 3 e 6 horas. Após isso, novo lactato e reavaliação para discutir as próximas medidas.
Reposição volêmica e fluidorresponsividade
A reposição volêmica deve ser feita utilizando 30ml/kg de cristaloide. Apesar dos estudos não mostrarem diferença em redução de mortalidade entre o soro fisiológico e ringer lactato, há um crescente aumento da preferência para o uso de Ringer Lactato. Isso se dá porque o soro fisiológico contém cloro iônico, o que contribuiria para uma acidose metabólica hiperclorêmica.
Muito se questiona também sobre uma reposição vigorosa de 30ml/kg. Por exemplo, para um paciente de 70 kg isso seria 2100 mL de cristaloide, um valor alto. Alguns pacientes não suportam esse valor e evoluem com congestão pulmonar. Logo, o ideal é se fazer uma avaliação da fluidorresponsividade com medidas de monitorização hemodinâmica estáticas e dinâmicas.
A avaliação da ressuscitação volêmica pode ser feita utilizando os seguintes parâmetros:
Medidas Específicas:
Antibióticoterapia
Antibioticoterapia de amplo espectro (< 1 hora a admissão);
- A escolha do antibiótico depende do sítio de infecção, do uso prévio de antimicrobianos, comorbidades, patógenos locais.
- Deve ser reavaliado diariamente para possível descalonamento.
Se houver suspeita que o acesso venoso seja a fonte de infecção, esse deve ser removido imediatamente.
Se houver suspeita de abscesso, drenar o mais breve possível (sugere-se nas próximas 12 horas de internação).
Drogas vasoativas
Como já foi abordado, o vasopressor inicial é a noradrenalina. Seu valor inicial é de 0,1 mcg/kg/min. Após titular essa dose devemos avaliar se há necessidade de outro vasopressor, normalmente valores maiores que 0,5 mcg/kg/min de noradrenalina já nos fazem pensar em outro vasopressor. As próximas drogas de escolha são a vasopressina e a adrenalina.
A dobutamina é utilizada quando há sinais de disfunção miocárdica. Seja porque o paciente permanece hipoperfundido mesmo com PAM adequada ou seja porque o ecocardiograma a beira leito indicou baixa contratilidade.
A dopamina não tem tanto espaço no choque séptico e é reservada para pacientes selecionados (comprometimento f. sistólica, algumas bradicardias).
Terapia vasopressora
• É recomendada quando não se atinge o alvo da PAM, após a reposição volêmica;
• Noradrenalina é a droga de escolha;
• Adrenalina pode ser associada, quando for necessário um agente adicional para manter PAM. A vasopressina é uma opção.
- Noradrenalina: 0,01 a 2mcg/kg/min
Existem 2 tipos
– bitartarato de norepinefrina (Levophed®) – 1 ampola = 4mg/4ml;
– hemitartarato de norepinefrina (Hyponor®) – 1 ampola = 8mg/4ml de hemitartarato de norepinefrina, que equivale a 4mg/4ml de norepinefrina base
Diluição (concentração 64 mcg/ml):
Soro Glicosado 5% 234 ml EV em bomba de infusão contínua
+ Noradrenalina 4mg/4ml – 4 amp
Dica prática: nessa diluição apresentada, 1 ml/h equivale aproximadamente a 1mcg/min.
Dose: 0,01 a 3 mcg/Kg/min; Dose inicial: 2 a 4 mcg/min. Dose média: 1 a 12 mcg/min.
- Vasopressina: 0,01 a 0,04U/min
Apresentação 20U/mL injetável (ampola 1mL)
Preparo / Diluição 100mL SG 5% ou SF. Concentração Máxima
1U/mL. Utilizar preferencialmente veia central Medicamento Vesicante: administrar via cateter venoso central (CVC) devido a alto risco de ulceração e necrose. Administração EV em bolus ou infusão contínua, IM ou SC. 0,01UI/min a 0,04 UI/min (≈ máx. 24ml/h). Associá-la apenas no choque séptico refratário (já com catecolamina), objetivando alcançar PAM ≥ 65mmHg.
- Adrenalina: 0,005 a 0,1mcg/kg/min.
Terapia inotrópica
• É recomendada caso haja evidência de disfunção do miocárdio ou sinais de hipoperfusão apesar da PAM e volume intravascular otimizados (podemos usar saturação venosa central, clerance de lactato ou outros parâmetros para avaliar).
- Dobutamina: 2,5 a 15 mcg/kg/min.
Apresentação – amp de 20 ml/250 mg. Diluição padrão – 1 amp em 230 ml de SF 0,9% (1 mg/ml).
Corticoterapia
O corticoide utilizado é a hidrocortisona 200mg IV 1x ao dia
Frente aos resultados do recente estudo Adrenal, é também possível que os demais pacientes com choque tenham benefícios, em termos de redução de tempo de ventilação mecânica e de tempo de internação em UTI. Assim, a utilização deve ser individualizada.
• Indicado quando choque refratário;
- Hidrocortisona: 200mg/d preferencialmente em infusão contínua.
Hemoderivados
• Concentrado de hemácias: Indicado se Hb < 7,0 g/dl, na ausência de IAM, hipoxemia severa, hemorragia aguda. Objetivo é um Hb entre 7,0 e 9,0.
• Transfusão de plaquetas:
- < 50.000 – se sangramento ativo, cirurgia ou procedimento invasivo.
- < 20.000 – se risco de sangramento.
- < 10.000 – profilático.
• Plasma:
- INR > 1,5 – considerar 10mL/Kg se CIVD e sangramento ou se procedimento invasivo
Ventilação Mecânica.
• Vide capítulo específico. Sedação e bloqueio neuromuscular.
Controle da glicemia.
• Manter glicemia < 180mg/dL e evitar hipoglicemia.
• Deve ser monitorizada a cada 1 ou 2 horas até os valores ficarem estáveis, então passar para 4 em 4 horas.
Nutrição
• A dieta (oral ou enteral) deve ser iniciada nas primeiras 48h.
• Na primeira semana evitar fornecer todo aporte calórico, manter 500cal por dia e ir progredindo a dieta conforme tolerado.
Prevenção
• Prevenção de pneumonia associada a ventilação mecânica.
Descontaminação oral: Gluconato de clorexidina.
- Cabeceira elevada;
- Aspiração e cuidados com o tubo.
• Em paciente sem abertura ocular, usar hipromelose;
• TVP;
- HBPM é a droga de escolha, caso haja contraindicações à HBPM utilizar HNF. Se houver contraindicação ao uso de heparinas, utilizar dispositivos de compressão pneumática.
Enoxaparina: 40 mg subcutânea uma vez ao dia;
HNF: 5000UI subcutânea 12/12h (preferir em lesão renal aguda).
- Na sepse grave/choque séptico pode-se associar dispositivos de compressão pneumática à terapia farmacológica.
• Úlcera de estresse;
- Inibidor de bomba de prótons é a droga de escolha Omeprazol: 40mg EV uma vez ao dia
Saturação venosa central
As amostras de sangue coletadas do acesso central - via distal. A posição da ponta do cateter venoso central confirmada por meio de uma radiografia do tórax. Descartam-se os primeiros 5mL de sangue coletados para cada amostra, assim prevenindo a ocorrência de diluição. A amostra idealmente deve ser colocada em gelo, e todas as mensurações realizadas dentro de, no máximo, 30 minutos após cada coleta. Excluímos todas as amostras com ScvO2 ou SfvO2 > 85% se os pacientes também tivessem hiperóxia, definida como a presença de uma pressão arterial de oxigênio (PaO2) superior a 120mmHg.
Metas definidas:
• PAM > 65mmHg;
• Saturação venosa central > 70%;
• Diurese > 0,5mL/Kg/h;
• Clerance de lactato após medidas iniciais de 10% (cálculo do clearance de lactato, sob a seguinte fórmula: clearance lactato=(lactato admissão) - (lactato 6 h)/ (lactato admissão) X 100 );
• PVC de 8 a 12mmHg (11 a 16cmH2O) ou 12 a 15mmHg (16 a 20cmH2O) se ventilação mecânica).
• Gap CO2 (CO2 arterial – CO2 venoso) < 6;
• Controlar glicemias, mantendo abaixo de 180, mas evitando hipoglicemia;
• Redução da frequência cardíaca; da frequência respiratória; do tempo de enchimento capilar; Melhora da relação PaO2/FiO2; evitar hipo ou hipertermia;
• SUSPEITAR PRECOCE DE SEPSE e fazer antibiótico na primeira hora de internação!
• Seguir os pacotes inicias de tratamento (pacote das 3 horas e das 6 horas.
Fontes :
https://sanarmed.com/como-conduzir-um-caso-de-choque-septico-yellowbook/
https://www.scielo.br/j/rbti/a/LdmmG4YsFBbxjyqGf9G95Zv/
https://sanarmed.com/lactato-elevado-em-pacientes-adultos-entenda-as-principais-causas-posme/
https://blog.curem.com.br/wp-content/uploads/2022/07/CUREM_Podcast_Choque_qual-amina_doses-.pdf