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RESSONÂNCIA MAGNÉTICA COM CONTRASTE FÍGADO ESPECÍFICO

Considerações iniciais

A ressonância magnética (RM) é um exame bem estabelecido para a avaliação de lesões focais hepáticas. Entretanto, até 60% dos nódulos malignos, particularmente os menores do que 1,0cm e em fígados cirróticos, podem não ser detectados e nem caracterizados pela RM. Os contrastes hepato-específicos foram criados para aumentar a sensibilidade e a especificidade da RM na avaliação das lesões focais hepáticas, bem como suplantar algumas das limitações dos contrastes extracelulares. Dentre os contrastes hepato-específicos atualmente disponíveis, o ácido gadoxético (Gd-EOB-dTPA, Primovist®, Bayer Schering, Berlim, Alemanha) é o único aprovado para uso clínico no Brasil.

 

PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E BIODISPONIBILIDADE

O Gd-EOB-dTPA é um contraste hepato-específico paramagnético ligado ao gadolínio, com propriedades combinadas de perfusão e seletividade hepatocitária, desenvolvido primariamente para aumentar a detecção e a caracterização das lesões focais hepáticas. Após a administração intravenosa do Gd-EOB-dTPA, ele rapidamente é distribuído pelo compartimento vascular/intersticial, sendo possível a aquisição de estudo dinâmico multifásico (fases arterial, portal e de equilíbrio). Aproximadamente 50% da dose injetada do GdEOB-dTPA é seletivamente captada pelos hepatócitos funcionantes e posteriormente excretada pela bile, permitindo a aquisição de uma fase hepatobiliar tardia, em aproximadamente 10 a 20 minutos após sua injeção

Nessa fase, as lesões sem hepatócitos (ou com hepatócitos disfuncionais) aparecem com baixo sinal de RM (mais escuras sobre um fígado claro), com maior contraste fígado/lesão, melhorando a capacidade diagnóstica do método. Devido a essa especificidade hepatocitária, a dose recomendada de gadolínio é até quatro vezes menor do que a recomendada para os contraste extracelulares.

A alta captação do contraste se dá pelas propriedades lipofílicas do Gd-EOB-dTPA, favorecendo a difusão passiva do mesmo por transportadores moleculares OATP1 presentes na membrana basolateral dos hepatócitos normais. Após a captação pelos hepatócitos, o Gd-EOB-dTPA é eliminado de forma semelhante pelas vias biliar (50%) e urinária (50%). A nível molecular, a excreção biliar é dependente do transportador molecular MPR2 presente na membrana canalicular da célula.

 

 

INDICAÇÕES DA RESSONÂNCIA MAGNÉTICA COM ÁCIDO GADOXÉTICO:

Investigação primária e follow-up de pacientes com cirrose, em especial dos que tenham nódulos indefinidos com o protocolo convencional do exame

Abordagem de indivíduos com metástases hepáticas que sejam candidatos à ressecção cirúrgica, sobretudo no carcinoma colorretal

Avaliação de complicações pós-cirúrgicas envolvendo as vias biliares

Auxílio à diferenciação entre adenoma e hiperplasia nodular focal

Especulação da função hepática segmentar em pacientes com proposta de hepatectomias

USO CLÍNICO EM HEPATOPATIAS CRÔNICAS

Os carcinomas hepatocelulares, ou hepatocarcinomas (HCC), podem ser diagnosticados de modo não invasivo, nos pacientes com risco aumentado, por meio de exames de imagem. Tipicamente apresentam intenso realce arterial, com lavagem nas fases venosa e de equilíbrio, tanto na tomografia computadorizada quanto na RM.

A presença de gordura ou de pseudocápsula (realce periférico simulando cápsula verdadeira) nas fases tardias aumenta a confiança no diagnóstico. Na RM, achados complementares incluem discreto alto sinal em T2 e restrição à difusão das moléculas de água. Foram descritos padrões distintos para os HCC após a injeção do Gd-EOB-dTPA, dependendo da expressão do transportador molecular OATP1. Como a maioria dos HCC não apresenta hepatócitos funcionantes, cerca de 80 a 90% apresentam hipossinal na fase hepatobiliar em relação ao parênquima hepático adjacente.

Cerca de 10 a 20% dos HCC moderadamente ou bem diferenciados, entretanto, cursam com uma expressão aumentada do transportador OATP1, resultando em isossinal ou hipersinal em relação ao parênquima hepático adjacente. Ocasionalmente, em cerca de 10% dos HCC e, na maioria das vezes, em lesões pequenas, o hipossinal na fase hepatobiliar pode ocorrer sem a hipervascularização na fase arterial ou o hipersinal em T2 e na difusão.

 

HEPATOCARCINOMA INICIAL VERSUS NÓDULO REGENERATIVO/DISPLÁSICO

O conceito de HCC inicial (early HCC), descrito pelo Liver Cancer Study Group of Japan e mundialmente aceito hoje em dia, ainda gera confusões entre os patologistas japoneses e os patologistas ocidentais. Apesar de terem sido descritos vários marcadores moleculares para o diagnóstico do HCC inicial, com alta taxa diagnóstica quando usados em conjunto, a diferenciação acurada entre nódulo displásico e HCC inicial ainda necessita da identificação da invasão estromal. Assim, frequentemente essa diferenciação não é possível por biópsia, a não ser que a área de invasão estromal esteja incluída no espécime. Tal diferenciação em exames de imagem costumava ser altamente desafiadora, mesmo com a utilização de técnicas avançadas, como TC durante arteriografia hepática ou TC-portografia. A RM com contraste hepato-específico tem se mostrado um verdadeiro divisor de águas nesse campo. Partindo do princípio de que o HCC inicial costuma apresentar baixo sinal na fase hepatobiliar, e de que o nódulo displásico apresenta iso/hipersinal , a acurácia diagnóstica para o HCC inicial atualmente chega a mais de 95%.

Além disso, estudos que seguiram o curso natural dos nódulos hipovasculares com hipossinal na fase hepatobiliar demonstraram que, mesmo que o HCC inicial seja descartado na biópsia, existe alta probabilidade desse nódulo passar a apresentar hipervascularização, tornando-se um HCC típico no futuro.

Em outras palavras, mesmo que a biópsia exclua o diagnóstico de HCC inicial, os nódulos hipovasculares com hipossinal na fase hepatobiliar podem ser encarados como tal para efeito de programação terapêutica, já que apresentam altíssimo risco para transformação maligna.

 

HEPATOCARCINOMA HIPERVASCULARIZADO VERSUS PSEUDOLESÃO COM REALCE ARTERIAL

Os shunts artério-portais podem simular HCC hipervascularizados em estudos de tomografia computadorizada e RM convencionais. Tais shunts são mais frequentes em fígados cirróticos, aparecendo como lesões hipervascularizadas, que variam de 0,5 a 2,0cm, geralmente sem expressão significativa em nenhuma outra sequência do exame. No entanto, até cerca de 50% dos focos hipervascularizados nos fígados cirróticos correspondem na verdade a HCC, sendo difícil sua caracterização sem o benefício de exames seriados. Atualmente, com o uso do contraste hepato-específico, tal diferenciação torna-se possível, uma vez que os shunts correspondem a áreas de parênquima preservado (com isossinal ao restante do fígado na fase hepatobiliar tardia), enquanto que os HCC, em sua maioria, não apresentam hepatócitos funcionantes (com hipossinal na fase hepatobiliar tardia

 

Fontes 

https://journal.einstein.br/wp-content/uploads/articles_xml/1679-4508-eins-S1679-45082015000200027/1679-4508-eins-S1679-45082015000200027-pt.pdf

https://www.fleury.com.br/medico/artigos-cientificos/rm-pode-ser-feita-com-contraste-exclusivo-para-avaliacao-hepatobiliar-revista-medica-ed-1-2013

https://altadiagnosticos.com.br/exames/rm-abdome-contraste-hepato-especifico/