TRATAMENTO DE HIPERTIREOIDISMO
Considerações iniciiais
O tratamento do hipertireoidismo depende da causa (1), mas pode compreender
Captação de iodo radioativo
Metimazol ou propiltiouracil
Betabloqueadores
Iodo
Cirurgia
Iodeto de sódio radioativo (iodo-131, radioiodo)
Nos Estados Unidos, o Iodo-131 constitui o tratamento mais comum para hipertireoidismo. Costuma ser recomendado como tratamento de escolha para doença de Graves e bócio nodular tóxico em todos os pacientes, incluindo crianças. É difícil ajustar a dosagem de Iodo-131 porque a resposta da glândula não é previsível; alguns médicos administram uma dose padrão de 8 a 15 millicurie. Outros ajustam a dose com base no tamanho estimado da tireoide e na captação de 24 horas para fornecer uma dose de 80 a 120 microcurie/g de tecido tireoidiano.
Quando se administra o Iodo-131 em dose suficiente para causar eutireoidismo, cerca de 25 a 50% dos pacientes passam a apresentar hipotireoidismo mais ou menos 1 ano mais tarde, e a incidência continua aumentando anualmente. Assim, a maioria dos pacientes finalmente se torna hipotireoidiana. Entretanto, se forem utilizadas doses mais baixas, a incidência de recidiva é maior. Doses mais altas, como 10 a 20 millicurie, costumam causar hipotireoidismo em 6 meses e, portanto, a ablação (isto é, ou seja, com Iodo-131) tornou-se a abordagem terapêutica de escolha.
O iodo radioativo não é utilizado durante a lactação porque ele pode entrar no leite materno e causar hipotireoidismo no neonato. Ele não é utilizado durante a gestação porque atravessa a placenta e pode causar hipotireoidismo fetal grave. Não há provas de que ele aumente a incidência de tumores, leucemia, câncer de tireoide ou defeitos de nascença em crianças nascidas de mães com hipertireoidismo prévio que engravidaram mais tarde na vida.
Metimazol e propiltiouracila
Esses fármacos antitireoidianos bloqueiam a peroxidase tireoidiana, diminuindo a organificação de iodo, e alteram a reação de acoplamento. A propiltiouracila em altas doses também inibe a conversão periférica de T4 em T3.
Metimazol é o fármaco preferido. A dose inicial usual de metimazol é de 5 a 20 mg por via oral 2 ou 3 vezes ao dia. A normalização do TSH atrasa a normalização dos níveis de T4 e T3 em uma ou mais semanas. Portanto, quando os níveis de T4 e T3 normalizam, reduz-se a dose para a menor dose eficaz, geralmente 2,5 a 10 mg de metimazol, uma vez ao dia para evitar a indução de hipotireoidismo. Em geral, o controle é alcançado em 2 a 3 meses. Doses de manutenção de metimazol podem ser mantidas por um ou vários anos, dependendo das circunstâncias clínicas.
O carbimazol, amplamente utilizado na Europa, mas que não está disponível nos Estados Unidos, é rapidamente convertido em metimazol. A dose inicial é semelhante à do metimazol; a dose de manutenção é de 2,5 a 10 mg por via oral uma vez ao dia ou 2,5 a 5 mg duas vezes ao dia.
Propiltiouracil
Por causa da insuficiência hepática grave em alguns pacientes < 40, especialmente crianças, propiltiouracila agora só é recomendada em situações especiais (p. ex., no 1º trimestre de gestação, na tempestade tireotóxica). A dose inicial usual de propiltiouracila é de 100 a 150 mg por via oral a cada 8 horas. Controle rápido pode ser obtido com o aumento da dose de propiltiouracila para 150 a 200 mg a cada 8 horas. Essas doses ou doses mais altas (até 400 mg a cada 8 horas) são geralmente reservadas para pacientes gravemente enfermos, incluindo aqueles com tireotoxicose, para bloquear a conversão de T4 em T3. A dose de manutenção com propiltiouracil é de 50 mg, duas vezes ao dia ou 3 vezes ao dia
Efeito medicamentoso
Cerca de 20 a 50% dos pacientes com doença de Graves permanecem em remissão após 1 ou 2 anos de tratamento com qualquer um dos fármacos.
O retorno ao normal ou a diminuição significativa do tamanho da glândula, a restauração das concentrações normais de TSH sérico e o hipertireoidismo menos grave antes do tratamento são bons sinais prognósticos para remissão a longo prazo. O uso concomitante de tratamento antitireoidiano e levotiroxina não melhora a taxa de remissão em pacientes com doença de Graves. Como o bócio nodular tóxico raramente sofre remissão, o tratamento com fármacos antitireoidianos é administrado apenas no preparo para tratamento cirúrgico ou com Iodo-131.
Efeitos adversos
Os efeitos adversos incluem exantema, reações alérgicas, função hepática anormal (incluindo insuficiência hepática com propiltiouracila) e, em cerca de 0,1% dos pacientes, agranulocitose reversível. Pacientes com alergia a um dos fármacos podem tê-la substituída por outra, mas pode ocorrer sensibilidade cruzada. Se ocorrer agranulocitose, o paciente não pode trocar a medicação, devendo-se utilizar outra modalidade de tratamento (p. ex., radioiodo, cirurgia).
Dicas e conselhos
Se ocorrer agranulocitose com um dos fármacos de peroxidase antireoidiana (metimazol ou propiltiouracil), evitar o uso de outro fármaco da mesma classe; em vez disso, utilizar outra terapia (p. ex., radioiodo, cirurgia).
Potenciais efeitos adversos ou outras características variam entre os dois fármacos e orientam as indicações para cada um. O metimazol precisa ser administrado apenas uma vez ao dia, o que melhora a adesão ao tratamento. Além disso, quando o metimazol é utilizado em doses inferiores a 20 mg por dia, a agranulocitose é menos comum; com propiltiouracila, a agranulocitose pode ocorrer com qualquer dosagem.
O metimazol foi utilizado de maneira bem-sucedida em gestantes e amamentando sem complicações fetais ou infantis, mas raramente o metimazol foi associado a defeitos gastrointestinais e do couro cabeludo em recém-nascidos e com embriopatia rara. Devido a essas complicações, propiltiouracil é utilizado no 1º trimestre da gestação.
A propiltiouracila é preferível para o tratamento da tireotoxicose, pois as altas dosagens utilizadas (acima de 800 mg por dia) bloqueiam parcialmente a conversão periférica de T4 em T3, além de diminuir a produção na tireoide.
A combinação de alta dose de propiltiouracila e dexametasona, também um potente inibidor da conversão de T4 em T3, pode aliviar os sintomas de hipertireoidismo grave como visto em pacientes com tireotoxicose e restabelecer as concentrações normais de T3 em uma semana.
Betabloqueadores
Sinais e sintomas de hipertireoidismo decorrentes de estímulo adrenérgico podem responder a betabloqueadores; o propranolol é o mais utilizado, mas atenolol e metoprolol podem ser preferíveis.
Outras manifestações tipicamente não respondem.
Manifestações que tipicamente respondem a betabloqueadores: taquicardia, tremor, sintomas mentais, atraso palpebral; ocasionalmente, intolerância ao calor e sudorese, diarreia, miopatia proximal
As manifestações que tipicamente não respondem aos betabloqueadores são: bócio, exoftalmia, perda ponderal, aumento do consumo de oxigênio e dos níveis de tiroxina circulantes
Indica-se propranolol para tireotoxicose.
Reduz rapidamente a frequência cardíaca, geralmente 2 a 3 horas após administração por via oral e minutos após administração IV. O esmolol só deve ser utilizado em uma unidade de terapia intensiva porque requer titulação e monitoramento rigorosos. Os betabloqueadores também são indicados para a taquicardia do hipertireoidismo, especialmente nos idosos, pois os antitireoidianos demoram algumas semanas até se tornarem totalmente eficazes. Os bloqueadores de canais de cálcio podem controlar as taquiarritmias em pacientes para os quais betabloqueadores sejam contraindicados.
Iodo
Iodo em doses farmacológicas inibe a liberação de T3 e T4 em questão horas e também inibe a organificação do iodo, um efeito transitório com duração de alguns dias a uma semana, após o que a inibição usualmente cessa. O iodo é utilizado para tratamento de emergência da tireotoxicose, para pacientes com hipertireoidismo submetidos a cirurgia não tireoidiana de emergência, e (como ele também diminui a vascularização da tireoide) para preparação pré-operatória de pacientes com hipertireoidismo submetidos à tireoidectomia. Iodo geralmente não é utilizado para tratamento de rotina do hipertireoidismo. A dose habitual é 2 a 3 gotas (100 a 150 mg) de uma solução saturada de iodeto de potássio, por via oral, 3 ou 4 vezes ao dia ou iodeto de sódio em soro fisiológico a 0,9% 1 L 0,5 a 1 g, IV administrada lentamente uma vez ao dia.
Complicações da terapia com iodo incluem inflamação das glândulas salivares, conjuntivite e exantema.]
Cirurgia
Indica-se a cirurgia para pacientes com doença de Graves cujo hipertireoidismo tenha reincidido após tratamento com doses antitireoidianas e que se recusam a utilizar Iodo-131, pacientes que não toleram outros fármacos, pacientes com bócios muito volumosos e alguns pacientes mais jovens com adenoma tóxico e bócio multinodular. A cirurgia pode ser realizada em pacientes idosos com bócios nodulares gigantes.
A cirurgia habitualmente restabelece a função tireoidiana normal. As recidivas pós-operatórias variam de 2 a 16%; o risco de hipotireoidismo está diretamente relacionado com a extensão da cirurgia. Paralisia das pregas vocais e hipoparatireoidismo são complicações incomuns. Solução saturada de iodeto de potássio, 3 gotas (cerca de 100 a 150 mg) por via oral 3 vezes ao dia, deve ser administrada por 10 dias antes da cirurgia para reduzir a vascularização da glândula. Deve-se primeiro administrar metimazol porque o paciente precisa estar eutireoideo antes da administração de iodo. Pode-se acrescentar dexametasona para restaurar rapidamente o eutireoidismo. Os procedimentos cirúrgicos no pescoço anterior são mais difíceis em pacientes que foram previamente submetidos a tireoidectomias ou tratamento com radioiodo.
Tratamento da tireotoxicose
O regime de tratamento para tireotoxicose é mostrado na tabela Tratamento da tireotoxicose. Abordar também as causas precipitantes.
Tratamento de dermopatia infiltrativa e oftalmopatia
Na dermopatia infiltrativa (na doença de Graves), corticoides tópicos ou injeções de corticoide nas lesões pode diminuir a dermopatia. Às vezes, a dermopatia remite espontaneamente após meses ou anos.
Oftalmopatia deve ser tratada em conjunto por endocrinologista e oftalmologista e pode necessitar de selênio, corticoides, irradiação orbital e cirurgia. Tireoidectomia cirúrgica pode ajudar a resolver ou prevenir a progressão da oftalmopatia. Teprotumumabe, um inibidor do receptor do fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1 (IGF-1), é uma terapia muito eficaz para a oftalmopatia moderadamente grave (2). Radioiodoterapia pode acelerar a progressão da oftalmopatia quando ela está ativa, e é, portanto, contraindicada nesta fase ativa.
Tratamento do hipertireoidismo subclínico
Em pacientes com hipertireoidismo subclínico que tomam levotiroxina, a redução da dose é o tratamento mais apropriado, a menos que o objetivo do tratamento seja manter os níveis de TSH suprimidos em pacientes com câncer de tireoide.
Indica-se o tratamento para pacientes com hipertireoidismo endógeno subclínico (TSH sérico < 0,1 mU/L), em especial aqueles com fibrilação atrial ou redução da densidade mineral óssea. O tratamento usual é Iodo-131, mas baixas doses de metimazol também são eficazes.
Fontes
1. Ross DS, Burch HB, Cooper DS, et al: 2016 American Thyroid Association Guidelines for Diagnosis and Management of Hyperthyroidism and Other Causes of Thyrotoxicosis. Thyroid 26(10):1343–1421, 2016. doi: 10.1089/thy.2016.0229
2. Douglas RS, Kahaly GJ, Patel A, et al: Teprotumumab for the treatment of active thyroid eye disease. N Engl J Med 382(4):341–352. 2020. doi: 10.1056/NEJMoa1910434