HIPERPROLACTINEMIA
Considerações iniciais
Prolactina é um hormônio produzido pela adeno-hipófise, cuja função primordial em humanos é contribuir para o desenvolvimento e maturação da mama durante a gravidez e para a subsequente produção de leite durante a lactação. Hiperprolactinemia é a alteração endócrina mais comum do eixo hipotálamo-hipofisário e pode ser a etiologia em 20% a 25% das pacientes com amenorreia secundária.
Quadro clínico
As principais manifestações clínicas da hiperprolactinemia são galactorreia e sinais e sintomas de hipogonadismo (amenorreia/oligomenorreia nas mulheres, disfunção sexual nos homens, infertilidade, diminuição da libido e da densidade mineral óssea em ambos os sexos). Nos macroprolactinomas e outros tumores selares, a compressão de outras células hipofisárias, bem como da haste hipotálamo-hipofisária pode causar hipopituitarismo. Nos tumores grandes, com compressão do quiasma, manifestações neurológicas e oftalmológicas são comuns, representadas principalmente por cefaleia e alterações do campo visual (hemianopsia uni ou bilateral)
Diagnóstico diferencial
Durante a avaliação de um paciente com sintomas ou sinais clínicos e/ou exames laboratoriais de hiperprolactinemia, é fundamental que causas fisiológicas e medicamentosas sejam afastadas por meio de história clínica cuidadosa, exame físico adequado e teste de gravidez, quando necessário.
Deve-se também dosar o hormônio estimulante da tiroide (Thyroid-stimulating hormone – TSH) e realizar exames bioquímicos de função renal (creatinina sérica) e hepática (AST/TGO e ALT/TGP), para que sejam afastados, respectivamente, hipotireoidismo primário, insuficiência renal e insuficiência hepática.
Sugere-se, também, que o diagnóstico de acromegalia seja afastado nos pacientes com características clínicas desta doença, bem como nos indivíduos com macroadenoma hipofisário.
O diagnóstico de macroprolactinemia deve ser considerado nos indivíduos sem sinais e sintomas relacionados à hiperprolactinemia, cuja detecção em exame laboratorial tenha sido casual.
Pesquisa de causas
As causas de hiperprolactinemia podem ser classificadas em fisiológicas, farmacológicas e patológicas.
Frente a um paciente com hiperprolactinemia, deve-se iniciar a abordagem pela pesquisa de causas fisiológicas e medicamentosas, que podem ser afastadas por meio de cuidadosa história clínica, exame físico e teste de gravidez em mulheres em idade fértil. Além disso, solicitar na propedêutica função tireoidiana (TSH), renal (creatinina, para estimativa de RFG) e hepática, visando pesquisar hipotireoidismo primário, insuficiência renal e insuficiência hepática.
Causas fisiológicas
As fisiológicas mais importantes são gravidez e amamentação.
Causas farmacológicas
Dentre as farmacológicas, a classe de medicamentos mais comumente associada à hiperprolactinemia é a dos antipsicóticos (fenotiazinas, butirofenonas, risperidona, sulpirida), entretanto, outros medicamentos como os antidepressivos tricíclicos (amitriptilina, clomipramina), inibidores da monoaminoxidase (moclobemida, tranilcipromina) alguns anti-hipertensivos (verapamil, reserpina, metildopa), medicamentos de ação gastrointestinal (domperidona, metoclopramida) e, mais raramente, os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (fluoxetina, citalopram, sertralina) e os contraceptivos orais, também podem causar hiperprolactinemia.
Macroprolactinemia
Em pacientes assintomáticos com prolactina elevada é importante pesquisar a macroprolactinemia. Esta situação ocorre quando mais de 60% da prolactina circulante corresponde a macroprolactina, um complexo de alto peso molecular e baixa atividade biológica resultante da ligação da prolactina a imunoglobulinas circulantes. Tal situação em geral não requer nenhum tratamento, daí a importância de sua pesquisa em pacientes sem sintomas.
Como a prolactina é um hormônio heterogêneo que possui três formas circulantes quanto ao seu tamanho molecular. Predomina a monomérica (>90%) nos pacientes normais e naqueles com prolactinoma. A dímera tem peso intermediário e a forma de alto peso molecular é conhecida como macroprolactina
Hiperprolactinemia patológica
Após exclusão de causas fisiológicas e farmacológicas, o paciente com hiperprolactinemia de provável causa patológica poderia ser encaminhado a especialista em endocrinologia para acompanhamento conjunto, para seguimento da propedêutica, exame de imagem (ressonância magnética de sela túrcica) e tratamento, se necessários.
A hiperprolactinemia é também um achado comum em indivíduos com cirrose hepática ou insuficiência renal. A denominação hiperprolactinemia idiopática tem sido reservada para os pacientes nos quais não se encontra uma causa óbvia para esse distúrbio hormonal após investigação, podendo ser um microadenoma não visualizado por exame de imagem
Dentre as causas patológicas, as mais frequentemente responsáveis pelo aumento da prolactina são os prolactinomas, os adenomas hipofisários clinicamente não funcionantes (ACNF), o hipotireoidismo primário e a acromegalia.
Prolactinoma
Os prolactinomas são os tumores funcionantes mais comuns na hipófise. Representam aproximadamente 40% dos adenomas hipofisários, com uma prevalência entre 25 e 63 por 100 mil indivíduos e uma incidência de aproximadamente 3 a 5 casos novos por 100 mil indivíduos ao ano.
Classificação micro vs macroadenoma
São classificados de acordo com o tamanho, em microadenomas (menos de 10 mm de diâmetro) ou macroadenomas (10 mm ou mais). Nas mulheres, a proporção entre macro e microprolactinoma é de aproximadamente 1 para 8. Nos homens, os macroadenomas representam 80% dos casos;
Nesses casos, assim como na presença de qualquer outro tumor selar e/ou parasselar não-prolactinoma, a hiperprolactinemia decorre da diminuição do transporte de dopamina hipotalâmica para a hipófise, levando à ausência da ação inibitória da dopamina nas células lactotróficas normais. Esse processo tem sido chamado de desconexão hipotálamo-hipofisária ou compressão de haste e, classicamente, está associado a níveis séricos aumentados da prolactina, geralmente inferiores a 100 ng/mL.
Diagnóstico laboratorial
Os ensaios laboratoriais mais utilizados para a dosagem da prolactina são quimioluminescência e imunorradiométrico. Os valores de referência são comumente maiores nas mulheres do que nos homens e o limite superior não costuma ultrapassar 25 ng/mL, devendo-se interpretar de acordo com os valores normais indicados.
Geralmente, os níveis da prolactina têm relação com sua etiologia. Valores até 100 ng/mL são, na maioria das vezes, associados a medicamentos, causa idiopática, desconexão de haste ou microprolactinomas. Níveis de prolactina superiores a 250 ng/mL geralmente indicam a presença de prolactinoma. Entretanto, medicamentos como a risperidona e metoclopramida têm sido associados a níveis de prolactina superiores a 200 ng/mL.
A determinação inicial da prolactina sérica pode ser verificada em qualquer período do dia, devendo-se, entretanto, evitar estresse excessivo na punção venosa. Uma única determinação é geralmente suficiente para estabelecer o diagnóstico.
A pesquisa da macroprolactinemia é realizada pelo teste de precipitação, que se baseia na insolubilidade das imunoglobulinas após exposição a concentrações definidas de polietilenoglicol (PEG). Após o procedimento, recuperações menores do que 30% da prolactina estabelecem diagnóstico de macroprolactinemia, enquanto recuperações maiores do que 65% afastam o diagnóstico. Valores intermediários de recuperação (entre 30-65%) não permitem um diagnóstico preciso e, nestes casos, é necessário solicitar cromatografia líquida em coluna de filtração por gel para a definição do problema.
Efeito gancho
Além da macroprolactinemia, um outro cuidado que se deve ter na avaliação laboratorial de pacientes com hiperprolactinemia é o efeito gancho. O efeito gancho caracteriza-se pela leitura de valores pouco elevados da prolactina e deve ser considerado em todos os casos de macroadenomas da hipófise com 3 cm ou mais associados a níveis de prolactina ≤ 200 ng/mL. Para excluí-lo, deve-se solicitar dosagem da prolactina em soro diluído.
O diagnóstico diferencial se faz com os chamados “pseudoprolactinomas”, que são lesões selares e/ou perisselares que provocam hiperprolactinemia por compressão da haste hipofisária e não por produção excessiva de prolactina pela lesão. Nestes últimos, o nível de prolactina após diluição será semelhante ao pré-diluição, enquanto que nos macroprolactinomas hipofisários com efeito gancho, a dosagem da prolactina após diluição da amostra indicará valores extremamente altos de prolactina sérica, compatíveis com o tamanho do tumor