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Antidepressivos - manejo farmacológico

Considerações iniciais

A depressão é definida por um ou mais episódios depressivos na ausência de mania e hipomania. Cinco de nove sintomas estão presentes, como humor deprimido, anedonia, alteração no peso/apetite, insônia ou hipersonia, agitação/retardo psicomotor, fadiga, ideação suicida, dificuldade de concentração, culpa; em pelo menos duas semanas. O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) é caracterizado por preocupação excessiva e crônica sobre diferentes temas, associada a tensão aumentada, sendo o transtorno mais comum na atenção primária, estando entre os dez motivos gerais mais comuns de consulta. Uma pessoa com transtorno de ansiedade generalizada normalmente se sente irritada e tem sintoma físicos, como inquietação, fadiga fácil e tensão muscular. Pode ter problemas de concentração e de sono. Para fazer um diagnóstico, os sintomas devem estar presentes por pelo menos seis meses e causar desconforto clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes. Um aspecto essencial é a preocupação constante concomitante aos sintomas somáticos e psíquicos. Os receios mais frequentes são: medo de adoecer, de que algo negativo aconteça com seus familiares, de  não conseguir cumprir com compromissos profissionais ou financeiros.

No curso do transtorno, é comum a preocupação mudar de foco. É especialmente comum entre donas de casa e, entre os homens, mais comum entre os solteiros/separados e desempregados. Além do tratamento farmacológico, existem medidas não farmacológicas como atividades que diminuam os fatores de risco ou precipitantes, como inserção social e religiosa, atividade física e práticas integrativas.

 

Mecanismos de ação dos Antidepressivos

A teoria mais aceita para elucidar a etiologia do transtorno depressivo maior é a monoaminérgica.

Essa teoria sugere que a depressão está relacionada com uma deficiência na quantidade ou na função da serotonina (5-HT), noradrenalina (NA) e dopamina (DA) corticais e límbicas.

A linha mais convincente de evidências favoráveis à hipótese monoaminérgica se baseia no fato de que, até o momento, todos os antidepressivos disponíveis parecem exercer efeitos significativos sobre o sistema monoaminérgico.

Todas as classes de antidepressivos, segundo o que temos de evidência médica disponível, parecem aumentar a disponibilidade sináptica de 5-HT, NA ou DA. Contudo, as tentativas de desenvolver antidepressivos capazes de atuar em outros sistemas de neurotransmissores não foram efetivas até o momento.

Sendo assim, o mecanismo de ação básico destes fármacos é aumentar a biodisponibilidade de neurotransmissores na fenda sináptica, seja fornecendo uma dosagem exógena, seja impedindo a degradação do produto endógeno ou amplificando sua ação.

O tratamento não farmacológico da depressão deve ser instituído precocemente, e envolve, além das condutas preventivas acima citadas, a remoção ou controle dos fatores agravantes, orientação dos familiares e abordagem psicoterápica. A abordagem psicoterápica inclui terapia comportamental, cognitivo-comportamental, psicodinâmica e terapia baseada em resolução de problemas.

Para ansiedade generalizada, os medicamentos padronizados são os benzodiazepínicos, como diazepam e clonazepam, entre outros da mesma classe. Uma alternativa terapêutica para casos refratários é a eletroconvulsoterapia (ECT), considerada atualmente um tratamento eficaz para diversos transtornos psiquiátricos, que se torna uma opção segura com mínimos efeitos colaterais.

Quando se fala do tratamento farmacológico, as opções disponíveis são basicamente os antidepressivos das seguintes classes: inibidor seletivo de recaptação de serotonina, inibidor seletivo de recaptação de noradrenalina, duais, dopaminérgicos, tricíclicos, tetracíclicos, inibidores da monoamina oxidase, melatoninérgicos e carbonato de lítio, esse usado como estabilizador de humor, mas que também tem ação antidepressiva. O processo terapêutico se baseia no princípio de que os antidepressivos devem ser iniciados com a menor dose possível e o aumento deve ser gradual durante seu acompanhamento. É de fundamental importância a individualização do tratamento. Todas as classes dos antidepressivos têm eficácia similar, portanto, a escolha deve ser baseada nas características da depressão, efeitos colaterais do medicamento, associação de comorbidades, perfil farmacológico, tolerabilidade, custo e a presença ou não de distúrbio cognitivo. São exemplos de medicações utilizadas no tratamento da depressão: bupropiona, paroxetina, fluoxetina, amitriptilina, nortriptilina, sertralina, venlafaxina, desvenlafaxina, duloxetina, fluvoxamina, citalopram, mirtazapina, agomelatina, vortioxetina, trazodona, clomipramina, mirtazapina e escitalopram.

Estratégia medicamentosa

Uma vez que a medicação foi escolhida, o tratamento deve ser iniciado, tendo esta fase duração de quatro a oito semanas, tempo para avaliar a resposta à medicação ou se outras medidas devem ser adotadas no tratamento (ex: inicialmente, aumento da dose até a dose terapêutica máxima recomendada ou, se necessário, posterior mudança de classe ou associação medicamentosa). Na fase inicial do tratamento é importante destacar que o objetivo é a remissão completa dos sintomas, o que está relacionado ao menor risco de recaída. Se não houver resposta entre 4 e 8 semanas nas doses recomendadas, optar por outras medidas.

A fase de continuação corresponde aos 4 a 6 meses que se seguem ao tratamento da fase aguda. Visa manter as melhoras obtidas, evitando a recaída dentro de um mesmo episódio depressivo. Caso seja o primeiro episódio depressivo, deve-se manter o tratamento por 6 a 12 meses com as mesmas doses da fase aguda. No caso de recorrência, recomenda-se manter o tratamento por 3 anos ou mais. A redução da dose nesta fase é um fator de risco para recaídas. Contudo, se ao término desta fase as melhoras obtidas pelo paciente permanecerem, este é considerado recuperado do atual episódio. Neste caso, a descontinuação da medicação deve ocorrer de forma gradual até sua retirada total. Recomenda-se que a retirada ocorra entre 4 e 6 meses

Já a fase de manutenção tem por objetivo evitar que novos episódios ocorram (recorrência). Geralmente sua duração é longa. Caso o transtorno do humor seja um transtorno depressivo recorrente, o risco de recorrência pode chegar a 70- 80% após o segundo episódio ou até 80-90% após o terceiro episódio. Nestes casos, é recomendado manter a terapia por um período de 2 a 5 anos. A partir do terceiro episódio ou de episódios subsequentes, o tratamento pode ter duração indeterminada, sem redução das doses.

Alguns fatores de risco para recorrência, além dos já citados, são: gravidade do episódio depressivo, presença de ideação suicida, sintomas residuais, depressão crônica, história familiar de transtorno depressivo, comorbidades (ex: transtorno de ansiedade ou transtorno por uso de substâncias), início tardio (> 60 anos), duas ou mais tentativas de tratamento para se atingir a remissão. Vários medicamentos, quando usados em associação com antidepressivos, potencializam a ação destes, gerando remissão de sintomas do humor.

 

Hormônio antitireoidiano (T3), lítio, buspirona, carbamazepina, lamotrigina, pramipexol e antipsicóticos atípicos (olanzapina, quetiapina, aripiprazol ou risperidona) são opções bem definidas. Na prática, o que os dados mostram é que há benefícios evidentes na associação de antidepressivo + lítio mantendo este em um nível sérico em torno de 0,8 a 1,2mEq/L ou antidepressivo + antipsicótico atípico. Particularmente, a associação com antipsicótico atípico tem sido amplamente empregada com sucesso. Olanzapina (5 a 20mg ao dia), quetiapina (50 a 300mg ao dia), risperidona (2 a 8mg ao dia) e aripiprazol (5 a 30mg ao dia) mostram-se eficazes quando associados a antidepressivos.

Classes dos Antidepressivos

Os antidepressivos atualmente disponíveis compreendem uma notável variedade de tipos químicos.

São suas particularidades e as diferenças de seus alvos moleculares é que proporcionam a base para a distinção dos vários subgrupos.

Separamos, dentre as classes mais importantes, um resumo para você compreender quando uma classe é mais indicada conforme o quadro clínico que o paciente apresenta, lembrando que essa é uma condição que deve ser avaliada individualmente.

 

Inibidores seletivos da recaptação de serotonina

Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) representam uma classe quimicamente diversa de agentes cuja principal ação consiste na inibição do transportador de serotonina (SERT).

Essa ação é responsável por gerar o acúmulo deste neurotransmissor na fenda sináptica, aumentando sua disponibilidade e ação, por consequência. 

Na atualidade, há seis ISRSs que constituem os antidepressivos mais comuns de uso clínico, sendo considerados a primeira linha no tratamento da depressão devido algumas característica:

Facilidade de uso;

Segurança em superdosagem;

Tolerabilidade relativa;

Custo (todos estão disponíveis em forma genérica);

Amplo espectro de uso.

Os principais representantes dos ISRSs são: Fluoxetina, sertralina, citalopram, paroxetina, fluvoxamina e escitalopram.

 

Inibidores da recaptação de serotonina-norepinefrina (IRSN, ou duais)

Esses são fármacos que atuam na inibição da recaptação de serotonina-norepinefrina (IRSN, ou duais).

Todos os IRSNs ligam-se aos transportadores de serotonina (SERT) e de norepinefrina (NET), de forma reversível e com pouca afinidade.

Os principais representantes dos duais são: Venlafaxina, desvenlafaxina, duloxetina, levomilnaciprana e milnaciprana.

 

Antidepressivos tricíclicos

Os antidepressivos tricíclicos (ADTs) eram a classe dominante de antidepressivos até a introdução dos ISRSs nas décadas de 1980 e 1990. Todos apresentam um núcleo iminodibenzil (tricíclico) em sua composição.

Os ADTs são usados principalmente na depressão que não responde aos antidepressivos de uso mais comum, como os ISRSs ou os IRSNs.

Sua perda de popularidade advém, em grande parte, de seu menor perfil de tolerabilidade em comparação com agentes mais recentes, da dificuldade de seu uso e de sua letalidade em superdosagem.

Os principais representantes dos tricíclicos são: Imipramina, desipramina, amitriptilina, doxepina, nortriptilina, protriptilina, clomipramina e trimipramina.

 

Moduladores dos receptores 5-HT2

São fármacos que atuam principalmente como antagonistas do receptor 5-HT2, aumentando, como consequência, a disponibilidade de serotonina.

Os principais representantes dos moduladores dos receptores 5-TH2 são: trazodona, nefazodona e vortioxetina.

 

Antidepressivos tetracíclicos e unicíclicos

São fármacos considerados atípicos e indicados para casos específicos, a depender da sintomatologia mais incapacitante do paciente, por exemplo:

1. pacientes com queixas de insônia e perda de apetite se beneficiam da mirtazapina;

2. pacientes com efeitos adversos de caráter sexual ao uso de outras classes conseguem reverter queixa com bupropiona.

Contudo, esses não constituem os antidepressivos de primeira linha de tratamento.

Bupropiona, mirtazapina, amoxapina, vilazodona e maprotilina são alguns representantes dessa classe.

 

Inibidores da monoaminoxidase

São a primeira classe de antidepressivos modernos, introduzidos na década de 1950; entretanto, na atualidade, são raramente prescritos na prática clínica.

A diminuição da prescrição desses medicamentos se deve à sua toxicidade e interações alimentares e medicamentosas potencialmente letais.

Hoje, o uso fica restrito sobretudo no tratamento da depressão que não responde a outros antidepressivos mais toleráveis.

Os principais medicamentos dessa classe são: fenelzina, isocarboxazida, tranilcipromina, selegilina e moclobemida.

 

Antidepressivo melatonérgico

Atua como um agonista melatonérgico (MT1/MT2) e um antagonista do receptor de 5-HT2C, aumentando a melatonina e a serotonina.

Agomelatina é o principal metalonérgico.

 

Farmacocinética dos Antidepressivos

Os antidepressivos compartilham várias características farmacocinéticas.

A maioria apresenta absorção oral razoavelmente rápida, alcança níveis plasmáticos em 2 a 3 horas, liga-se com firmeza às proteínas plasmáticas, sofre metabolismo hepático e apresenta depuração renal.

Entretanto, mesmo dentro das classes, a farmacocinética de cada antidepressivo varia de modo considerável.

 

Farmacodinâmica dos Antidepressivos

Todos os antidepressivos atualmente disponíveis aumentam a neurotransmissão monoaminérgica por meio de vários mecanismos.

O mecanismo mais comum consiste na inibição da atividade do SERT, do NET ou de ambos os transportadores de monoaminas.

Os antidepressivos que inibem o SERT, o NET ou ambos incluem os ISRSs e os IRSNs (por definição), bem como os ADTs.

Outro mecanismo que aumenta a disponibilidade de monoaminas é a inibição de sua degradação enzimática (pelos IMAOs).

Outras estratégias para aumentar o tônus monoaminérgico incluem a ligação a auto-receptores pré-sinápticos (mirtazapina) ou a receptores pós-sinápticos específicos (antagonistas dos receptores 5-HT2 e mirtazapina).

Por fim, a disponibilidade aumentada de monoaminas para ligação na fenda sináptica resulta em uma cascata de eventos que aumentam a transcrição de algumas proteínas e a inibição de outras.

É a produção efetiva dessas substâncias que parece determinar os benefícios, bem como a toxicidade de determinado agente.

 

Indicações para o uso para os antidepressivos

Além do transtorno depressivo maior, esses fármacos atuam de forma significativamente importante em outras condições de saúde organizada na lista abaixo, como:

  • Transtornos de ansiedade;
  • Controle da dor crônica (principalmente os tricíclicos, como a amitriptilina);
  • Transtorno disfórico pré-menstrual (como os ISRS);
  • Cessação do tabagismo (bupropiona);
  • Transtornos alimentares (fluoxetina e  bupropiona, por exemplo)
  • Enurese noturna em criançasProblemas no desempenho sexual (algumas vezes causados pelos próprios antidepressivos, como ISRS e sanados com a troca de classe).

 

Interações medicamentosas

Cada medicamento individualmente carrega consigo um perfil de tolerabilidade, de efeitos adversos e interações medicamentosas.

Torna-se prudente avaliar individualmente cada fármaco, considerando as necessidades do paciente e o quanto de efeito adverso pode ser tolerado.

 

Fontes

.ipriani A, Furukawa TA, Salanti G, et al. Comparative efficacy and acceptability of 12 new-generation antidepressants: a multiple treatments meta-analysis. Lancet 2009;373:746–758.

Cipriani, A et al Comparative efficacy and acceptability of 21 antidepressant drugs for the acute treatment of adults with major depressive disorder: a systematic review and network meta-analysis. The Lancet. Vol. 391; April 7, 2018.; 391:1357-66.